Conheci um pouco melhor Roy Kellermann quando era dono de uma loja de antiguidades na Rua Floriano Peixoto (o espaço agora abriga a Óptica Scussel). Não é preciso dizer que o artista plástico blumenauense sempre revelou paixão por objetos antigos. Relógios especialmente.

Anos mais tarde (1999), serviram de tema para novas criações. Expôs seus quadros com relógios surreais na loja Masotti, situada defronte o Teatro Carlos Gomes. Aproveitou a ocasião, extrovertido ao extremo, para recitar aos visitantes, na ponta da língua, o poema O relógio, de Cassiano Ricardo:

"Diante de coisa tão doída,

Conservemo-nos serenos.

Cada minuto de vida

Nunca é mais, é sempre menos.

Ser é apenas uma face do não ser e não do ser.

Desde o instante em que se nasce

já se começa a morrer."

Mas foi na música que deixou marcas indeléveis na paisagem da cidade. Com voz privilegiada, encantava quando cantava em qualquer espaço. Paloma, a artista plástica e escritora chilena, na verdade Rosa Elvira Lizana Hernandez, radicada agora em Balneário Camboriú, mandou-me choroso e-mail. Disse que tinha sonhado com seu companheiro de ofício. Ele estava na UTI e se recusava a morrer. Paloma deu-lhe uma bronca: - "Vai, Roy, tua hora chegou". E me pergunta, lamuriante: - "Será que ficamos sós? Apenas eu, Noemi (esposa do falecido) e tu?".

Não bastasse, me intimou a fazer a contagem. Enumerar um a um os que restam vivos. Aleguei: -"Sempre fui péssimo em matemática, um zero à esquerda. Recuso-me, pois." Recordou uma passagem: estava pintando um quadro na praça do Biergarten e Roy chegou entoando em francês uma música do Dorival Caymmi. Aquela que tem o verso "Nada como ser rosa na vida". Do mesmo autor, eu me deliciava com a interpretação dele de Marina, em inglês.

Se perguntassem a Roy "que rei sou eu? (que rei és tu?"), responderiam no lugar dele: - "És o rei de tudo. Dos pincéis, das partituras, das almas humanas".

Imagino-o no espaço sideral, traçando linhas geométricas nas pontas do arco-íris. Cantando com Judy Garland Over the Rainbow. Era o próprio Mágico de Oz.