O gênio pornô (2)
-
(Fotos: )
Amigos (a expressão era usada dia sim, dia também por Nelson Rodrigues em sua coluna À sombra das chuteiras imortais , no jornal O Globo, do doutor Roberto Marinho). Amigos, agora o digo eu, tá uma delícia reler e digerir o livro O anjo pornográfico, a biografia do maior autor de teatro do Brasil, Nelson Rodrigues, escrita por Ruy Castro (Cia. Da Letras, 1992, 457 páginas).
O focalizado é o gênio da nossa ribalta... Como no cinema o foram Orson Welles e Carlito (assim era chamado em nosso país, nos tempos de seus primeiros filmes). A televisão cria monstros da patetice, nenhum sagrado, mas todos consagrados. Sílvio Santos e Faustões da vida.
Nelson encarnou a própria antítese. Era o anti-eu de si mesmo. Sua última peça, ironicamente, intitula-se O anti-Nelson Rodrigues.
Teve todas as doenças possíveis e imagináveis. Da tuberculose ao inesperado infarto. Sua família dissolveu-se num mar de tragédias que ele transporia, ponto por ponto, em seus escritos romanceados para o teatro, jornais e livros.
Carregou na testa a pecha de tarado, rótulo dado gratuitamente por seus mais ferozes inimigos e os mais dóceis amigos.
Quanto ao contraste, encarnou duas personagens, o Nelson real, homem de família, quando em quando tomava conta dele uma paixonite aguda, mas superável com o tempo, e o Nelson folclórico, o dono da pena , uma das mais virulentas na terra de Pedro Cabral.
Anticomunista por excelência, beija botas dos militares no período mais negro do regime, dava a alma para livrar os presos políticos, que frequentavam o outro lado do pomar, jardins e quintais, cheios de rosas vermelhas , cortadas a foice, quando necessário.
O que não impedia que suas peças ficassem censuradas, por vezes por mais de 10 anos. Uma delas - Vestida de Noiva - foi encenada na Furb por Edith Kormann, viúva, porém honesta (aliás, título de um de seus textos). Só que a diretora, em nome da moral, tirou da encenação todos os palavrões. Descaracterizou portanto a criação rodrigueana.
O ferino crítico Norton Azambuja atacou-a violentamente. Mas foi vítima de um engano. Chamou a peça de Véu de noiva, que era o nome de uma novela global. Dona Edith aproveitou o deslize do jornalista e acusou-o de ter uma cultura puramente novelesca, ignorante pois sim.
Usando uma expressão do autor citado, a acusada só faltou mandar Norton comer capim, ao lado da cabra vadia (outra criação do nosso focalizado).
Deixe seu comentário