Ouvimos duas palestras de Fernando Sabino. Uma na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná, no início dos anos de 1960.

Falava de sua viagem a Cuba do barba preta (ainda) Fidel Castro. Em 1988, na Furb, conseguiu reduzir as partes do romance épico-didático de Euclides da Cunha, Os sertões. Citou duas, quando na verdade são três: A terra, que descreve o cenário em que se desenrolará a ação; O homem, completando a descrição do cenário com a narrativa da origem de Canudos e, principalmente, a de seu líder carismático, Antônio Conselheiro; e a terceira é A luta. O esquecimento de uma delas é omissão perdoável para um grande cronista como ele o foi. No entanto, falando em cronista, intitulou o pai do teatro popular em Portugal, Gil Vicente, de cronista. Verdade é que o termo é bastante amplo e aceita várias definições.

A Bíblia foi O Cronicão pelo tamanho. Quem escreve a história, escreve crônica. Mas, atualmente, a expressão reserva-se para nomear uma modalidade narrativa breve, episódica e comunicativa. Por sinal, merecedora de grande atenção por parte do público e da crítica. Jornal que se diz jornal abriga um ou mais cronistas. Mas os tropeços do autor de O encontro marcado e O homem nu foram compensados com esta rara joia de humor:

Chegando a casa, recebe da empregada um recado:

- Dr. Sabino, telefonou um tal da televisão.

- E você não pediu o nome?

Dias depois, recebe um telefonema e descobre o tal da televisão. Era Dalton Trevisan, o excelente contista, autor de O Vampiro de Curitiba, entre tantas outras obras.

Outro ledo engano. Iara Pedrosa, figura ímpar da Ilha de Santa Catarina, tinha um mordomo que acreditava piamente em tudo que ela dissesse.

Por pura brincadeira, afirmava-se íntima das maiores personalidades do mundo: Frankie Sinatra, Onassis, Orson Welles, Jackie Kennedy, Gandhi, Adolf Hitler, Grace Kelly, Fernanda Montenegro, Winston Churchill, o governador Comandante, o presidente Bolsonaro pra ficar por aqui.

Adelino, o mordomo, um dia foi chamar angustiado a sua "patroa".

- Dona Iara: corre que está no telefone a embaixatriz de Bombaim. Ela, surpresa, atendeu:

- Oi, Iara, tudo bem? Aqui é a Beatriz Paim (uma socialite de Floripa).

Última forma: Vidente - Gravei para a Rádio Alvorada uma entrevista com Fernando Sabino no hoje finado Grande Hotel Blumenau. O texto saiu no Jornal de Santa Catarina, no início dos colunistas-rotativos (eu escrevia às terças-feiras) em 2004. Dia seguinte ao meu registro com Sabino, o bom cronista morreu. Pura coincidência. Por telefone, o editor-chefe Edgar Gonçalves Júnior suplicou: - "Gervásio, por favor, não escreve uma linha sequer a meu respeito!".