Elza no espelho
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(Fotos: )
Estou com esta crônica encravada no gogó faz mais de ano e meio. Sou de texto fácil. O que isto significa? Penso num assunto para preencher este espaço e ele flui pacífico e solícito que nem água de bom bebedouro. Mas Elza - bem a Elza - exigiu-me esforço redobrado. Ela é especial. Também especial é o seu bar, pequenito, acolhedor, bem no Centro de Blumenau.
Os bêbados e os equilibristas batem ponto infalivelmente todos os dias. E não são funcionários públicos, por certo. São exemplos de um Brasil desequilibrado, à espera, confiantes, de um novo amanhecer.
A eles, todos, sem a menor distinção de raça, cor ou sexo, Elza dispensa o mesmo tratamento. Polido, porém austero, quando convém. Passou dos limites, falou alto demais, destratou alguém, cantou feito Vicente Celestino ("Tornei-me um ébrio, da bebida sou escravo...") é pedir a intervenção da proprietária. Basta um olhar severo-sereno ou umas palavrinhas de "atente-se" e o inconveniente cai na real. No mais das vezes, puxa do real, paga o que deve e se escafede.
O que mais impressiona este pobre escriba é a cena que se repete diariamente, incontornável: Elza no espelho. Seis da manhã, bate o sino da Catedral, e lá está ela, na maior naturalidade, a maquiar-se. Coloca um espelho no balcão e como se fizesse café, põe-se a se embelezar. Sobrancelhas, batom no lábio e etc., que, graças a Deus, pouco entendo dessas coisas.
Quando, instada a falar de seu passado, pouco informa:
- Nasci em Santo Amaro da Imperatriz.
Com ternura fala dos filhos. Mesmo morando longe, alguns sempre a visitam. Trazem os netinhos, todos à espera da bênção da vó.
Elza transformou seu ambiente de bar em lar. Mora lá. E pouco sai. Nunca a vi na rua. Mora no coração de seus fregueses. Quando me despeço, sorrindo, ela diz:
- Tchau, garotão!
Sessentão, remoço, espelho da alma, empertigo-me, levanto os ombros, assobio, cumprimento desconhecidos, e, em voz baixa, insisto: - Tudo bem, Brasil!
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