A trajetória do primeiro cirurgião-dentista prático do Barracão e o legado deixado para filhos, netos e comunidade
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Seu Vitor dedicou mais de 30 anos à profissão / Foto: Arquivo Jornal Metas/
Dizem que o cirurgião-dentista é, de fato, o único profissional que consegue transformar o sorriso das pessoas. Hoje, a medicina bucal é capaz de operar verdadeiros milagres, como implantes dentários e lentes de contato que devolvem a beleza facial e a autoestima das pessoas. E nos anos 1950? Como era a profissão de cirurgião-dentista? Os recursos tecnológicos, por exemplo, eram bem mais modestos. Foi nesta época, há 64 anos, que um dentista e protético prático trocou a pequena Rio do Oeste, no Alto Vale, por Gaspar. Nos bairros Barracão, Bateias e localidade Óleo Grande, difícil é encontrar quem não tenha sentado na cadeira do cirurgião-dentista Vitor Dellagiustina. Ele foi o primeiro dentista do Barracão e um dos primeiros de Gaspar, é verdade que sem a formação acadêmica, o que era permitido na época. Vitor então se especializou em fabricar próteses dentárias e aparelhos ortodônticos, aliás, naquela época era comum se extrair o dente ao invés de tratá-lo.
Vitor faleceu em 18 e abril de 2018, deixando um legado que outros Dellagiustina querem perpetuar. O consultório, na Rua Fortunato Melato, onde também era a residência de Victor, da esposa Adelina e dos quatro filhos, é agoa de Márcio, 58 anos, único filho homem, que herdou também boa parte da clientela. "Eu lembro que eu ficava brincando por aí, e via ele atendendo às pessoas aqui em casa", recorda Márcio também gostava de observar o pai produzindo as próteses dentárias. "Na época do vestibular eu não tive dúvida: queria ser dentista, porque era a profissão que mais estava familiarizado", revela.
O filho conta que o pai começou trabalhando como assistente dentário nos municípios de Laurentino e Rio do Oeste. Mais tarde se especializou no segmento de protético e ortodôntico. A tecnologia atual permite a fabricação de próteses a partir de equipamentos sofisticados que simulam exatamente a arcada dentária do paciente, bem diferente da época em que Vitor iniciou. "Ele precisava fazer tudo no olho. As pessoas tinham que confiar muito no trabalho dele", diz Márcio. E seu Vitor não decepcionava, e assim conquistou uma clientela respeitável.
Márcio revela outro motivo que fez o pai a fixar residência e trabalho em Gaspar: "a nossa família tinha alguns parentes na cidade e o meu pai sempre foi aventureiro, hiperativo; ele então aproveitou essa oportunidade para iniciar essa nova jornada profissional".
Em 1956, ano em que seu Vitor chegou a Gaspar havia apenas outros dois dentistas na cidade, ambos da família Beduschi e que atendiam em consultórios no centro. Seu Vitor foi de fato, o primeiro dentista a atender em bairro. O primeiro endereço é bem conhecido dos moradores do Barracão: a casa da família Barbieri, hoje uma espécie de museu da colonização italiana do bairro e onde mora outro grande personagem da história: Moacyr Barbieri, filho de João Barbieri. A casa serviu de endereço para outros empreendimentos, porém, na época era uma espécie de ponto de encontro no bairro, pois quando as pessoas queriam informar uma localização sempre usavam o consultório como referência. Mesmo depois que o consultório mudou de endereço, mais próximo à divisa com o Bateias, continuou a ser referência para quem precisava de serviços odontológicos. "Meu pai era bem requisitado pelos moradores daqui e até de fora", afirma o filho. Segundo ele, cliente não faltava. "As pessosas vinham de Brusque de bicicleta e até de charrete para serem atendidas. formavam-se filas aqui [no pátio do consultório]", mostra. Naquele tempo, conta Márcio, não se marcava consulta. "As pessoas que tinham algum problema simplesmente chegavam e meu pai atendia", explica.
Seu Vitor não foi somente o primeiro dentista do bairro. Ele também foi o primeiro a ter um telefone, algo raro diante da falta de recursos tecnológicos. "Para você ter uma ideia, ele pagou a instalação de dez quilômetros de fio, que vinha do Centro para cá", revela o filho. A novidade foi muito comemorada no Barracão e as pessoas passaram a pedir o telefone do consultório para se comunicar com outras regiões da cidade e até de fora.
Depois de 32 anos atendendo no Barracão, seu Vitor se aposentou e Márcio, recém-formado em odontologia, assumiu o posto. "Eu e minha esposa havíamos acabado de chegar de São Paulo quando meu pai me entregou as chaves do consultório". Márcio recorda o início difícil, carregando nos ombros o peso de ser filho de Vitor Dellagiustina. "Eu havia recém saído da faculdade, com pouca experiência, e admito: um procedimento clínico que eu levava uma hora para concluir, meu pai fazia em cinco minutos".
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Márcio se emociona ao falar do pai, no detalhe, os equipamentos / Fotos: Daniel Schattschneider/
Museu e homenagem
O filho também tinha o desejo de homenagear o pai, e recentemente conseguiu remontar em Rio do Oeste, cidade natal de Vitor, um museu com praticamente todos os aparelhos do consultório que por muitos anos foi do pai no Barracão. Se "a fruta nunca cai longe do pé", imagina então várias frutas, pois a família Dellagiustina quer manter essa tradição de bons dentistas. O filho de Márcio já está cursando a faculdade de odontologia, assim como outra neta de Vitor. "Restam poucos Dellagiustina aqui na região, e praticamente todos seguem ou querem seguir a profissão do meu pai", diz orgulhoso Márcio, para quem o pai foi um espelho. Ele lembra que o pai tinha grande habilidade em aprender rápido. "Era só querer, aprender e fazer". Foi assim que seu Vitor trabalhou a vida toda, devolvendo o belo sorriso ao rosto dos clientes. Em 1996, a Câmara de Vereadores reconheceu os relevantes serviços prestadoss por Vitor à comunidade, assim como o seu legado e lhe conferiu o título de Cidadão Honorário, fechando com chave de ouro uma trajetória profissional de mais de três décadas de sucesso.
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