De 1999 a 2013 morreram só na cidade de Blumenau, 448 motociclistas (382 homens e 66 mulheres), conforme dados do DATA/SUS e Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. Em todos os anos do período a média de mortes do motociclistas em Blumenau tem sido maior do que a média nacional. A maioria com idade entre 20 e 39 anos, ou seja, no auge da idade cronológica e produtiva.
O que não falta no país são pesquisas envolvendo motociclistas em acidentes de trânsito, mas o que nenhuma dessas pesquisas explica é o impacto que tem a morte de um motociclista para a vida daqueles que ainda estão vivos e o quanto cada acidente de moto impacta para a decisão deles de se cuidarem mais no trânsito. De todas as mortes desde o início deste ano em Blumenau e até o fechamento deste artigo, 90% foram de motociclistas jovens, em pleno vigor da idade cronológica e produtiva. Não podemos esquecer que segundo dados da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT), 30% dos motociclistas acidentados tiveram contato com a moto na adolescência, antes dos 18 anos, e até na infância, e aprenderam a dirigir moto com amigos que os pais desconhecem ou com parentes. Muitos têm bicicletas e as empinam ou demonstram "habilidades" como se a magrela fosse uma moto. Adivinha qual é o sonho desses guris? Sobre duas rodas morrem os bons e os maus; morrem os pais de família, o trabalhador, morrem os "maluco", "os doidos" e os "vida loka". Morrem também os que estão no meio termo, aqueles que viviam a vida intensamente em todos os sentidos, e no que isso se refletia no trânsito. Perdi conhecidos, perdi amigos que só conhecia do ambiente virtual, perdi a chance de conhecer os que já se foram. Em uma pesquisa em andamento quando solicitei aos motociclistas para que definissem em uma palavra o que a moto significa para eles as respostas variaram entre "meu ganha pão", "liberdade", "doidera", "vida loka", "sonho realizado" e uma resposta insólita: "moto, se não souber usar, mata". Mas, será que é a moto que mata mesmo? Um monte de metal com motor, cabos e fios mata? Ou seria o modo como ela é usada em função de uma série de fatores individuais como: comportamento, traços de personalidade, arroubos da juventude, crenças pessoais, modo de pensar sobre a moto, modo de agir, os ganhos sociais que cada um quer obter com a moto, o modo como se exerce os autocuidados e se respeita as leis de trânsito? O fato é que se poderia discorrer tomos e tomos de literatura e fundamentações para tentar explicar porque tantos acidentes, feridos e mortos envolvendo veículos de duas rodas na cidade. Mas, para além das variáveis que envolvem condições socioeconômicas, culturais, psicossociais e tantas outras, está o fato a cada vez que um motociclista se fere, morre ou mata no trânsito. Isso é fenômeno mundial que se soma às características de cada lugar. Em se tratando de causas de acidentes de trânsito não cabem especulações, elucubrações ou juízos de valor a respeito disso ou daquilo. É claro que se o cara é ou era vida loka a passagem pela terra fica mais curta. Se era do tipo adolescente sem habilitação com diversas passagens pela polícia e morreu durante uma perseguição policial a tragédia já era meio que anunciada. Mas, também morre muita gente inocente nessa história contada a duas rodas. O cara podia ser doidão, mas era gente fina. Sim, dirão os mais próximos. O cara podia chutar na velocidade, mas era uma excelente pessoa, dirão outros. Mas, a questão não é essa: ser gente fina, gente boa ou ser um caco. Isso não serve de credencial ou de referências para quem se envolve em acidente de trânsito. O que vai definir tudo é o modo como se comporta na via pública, como dirige, como se protege, como se cuida e se importa com a responsabilidade e com as consequências de seus atos em via pública. Sem esquecer, claro, daqueles que são vítimas de condutores imprudentes e de muitos embriagados que lhes roubam a vida como fizeram com o meu amigo Fernando Tesch.
Márcia Pontes,
Especialista em Trânsito
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