Quase dois anos de pandemia. O que aprendemos e como vai ser o futuro convivendo com a COVID-19?
01/03/2022 21:00
Por toda minha vida profissional, por curiosidade, me perguntei como seria viver um fato histórico disruptivo. Eis que em março de 2020, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou a COVID-19 como uma pandemia, a população mundial ainda não tinha ideia do que poderia acontecer nos próximos meses. Muitos nem acreditavam na possibilidade dela durar muito tempo. Agora, após quase dois anos desde a confirmação do primeiro caso no país, a sociedade vem se recuperando aos poucos de uma das piores crises sanitárias que levou mais de 620 mil brasileiros. Esta Pandemia trouxe um período terrível na história da humanidade, precipitando mudanças de comportamento social e alterações de mercado.
Não bastassem os impactos na saúde, os efeitos negativos se estendem à economia. Um dos reflexos foi o aumento do desemprego. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem atualmente 13,5 milhões de desempregados, com uma taxa de 12,6%. A pandemia atingiu aspectos socioeconômicos globais, com graves recessões, prejudicando o acesso à alimentação básica, saúde e educação, mas principalmente em países em que a desigualdade social já é elevada, como no Brasil.
Em nenhuma das crises sanitárias mundiais do século 21 o número de mortes foi tão grande ou exigiu do Estado a injeção de recursos financeiros em escala tão elevada. Desta forma, a pandemia do coronavírus ensinou a necessidade de construir uma agenda de saúde pública com uma perspectiva integral e integrada, que reconheça a interdependência que existe entre as dimensões sanitária, social, econômica e ambiental.
Se o controle da pandemia tivesse sido mais rígido no Brasil desde o início com o isolamento social e criação de auxílio para as famílias mais pobres, não teríamos lotação de UTIs, falta de insumos básicos e atendimento insuficiente que levaram a colapsos nos sistemas de saúde, como o que foi presenciado em Manaus no início do ano com a falta de oxigênio em hospitais. Felizmente, mas sem esquecer dos que se foram, o cenário foi mudando com o avanço da vacinação e os sistemas de saúde conseguiram desafogar. Mas agora existe outra preocupação em relação ao setor de saúde que foi trazida pela pandemia. A brecha que se abriu com a falta de acompanhamento médico de outras doenças devido à necessidade de isolamento social e lotação de hospitais dedicados quase 100% à COVID-19 já demonstra algumas consequências negativas. No Brasil, a população deixou de realizar tratamentos médicos, incluindo quimioterapia e radioterapia, e cirurgias. De acordo com um estudo da Universidade de São Paulo (USP) coordenado pelo professor Nivaldo Alonso, cerca de 1 milhão de procedimentos cirúrgicos foram desmarcados ou adiados. Com a menor atenção e procura para o diagnóstico e tratamento de outras enfermidades recorrentes, as chances de cura podem ser menores. Este certamente está sendo um desafio para o setor médico público e privado. Uma alternativa é acelerar a adoção da digitalização dos sistemas de saúde que estimulem a procura por teleconsultas, ou até mesmo questionários online, nos quais os pacientes poderão relatar informações e sintomas que possibilitem a identificação de suspeitas de doenças. Os cidadãos também devem ser estimulados a procurarem os sistemas de saúde de forma presencial para consultas e exames de rotina utilizando-se dos protocolos padrões de segurança contra COVID-19, por meio de campanhas públicas de saúde. Com tantos efeitos negativos trazidos pela pandemia, o questionamento que fica é o que conseguimos aprender com ela. Talvez a primeira das lições foi valorizar a ciência e as instituições de pesquisa e a saúde pública. A segunda, e não menos importante, foi valorizar as relações humanas, o afeto e o cuidado com o próximo. Também aprendemos a melhorar nossos hábitos de higiene e nos adaptamos a um novo formato de vida, onde a maior parte das nossas atividades foram feitas à distância.
Por Euclides Matheucci Jr. diretor científico da DNA Consult