O alerta foi feito na véspera da abertura da Conferência da ONU sobre o Clima, a COP 28

Unicef/Vlad Sokhin Países pequenos como Kiribati sofrem frequentemente os piores efeitos das alterações climáticas

2023 ainda nem terminou e já é possível afirmar que este foi o ano mais quente da história. Foram quebrados recordes climáticos, que provocaram situações extremas com graves consequências para milhões de pessoas, como o calor no Hemisfério Norte e as chuvas e seca no Hemisfério Sul. Na véspera da Conferência da ONU sobre o Clima, a COP 28, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) publicou o seu relatório sobre o estado global do clima com informações preocupantes. Em 2023, o planeta teve temperatura 1,4 grau acima da linha-base pré-industrial (1850 a 1900).

A diferença entre este ano e 2016 e 2020, considerados outros dois anos mais quentes da história é tão abismal, que dificilmente os últimos 30 dias de 2023 poderão mudar esse cenário.

Antônio Guterres, secretário-geral da ONU, fala em colapso climático em tempo real, com impactos devastadores no planeta. “O relatório de hoje mostra que estamos em apuros”, alertou.

© Unicef/Karin Schermbrucker As condições de seca na Zâmbia levaram ao fracasso das colheitas, o que teve impacto na saúde das pessoas

O relatório da OMM mostra que o fenômeno “El Niño”, que atingiu o Hemisfério Norte no primeiro semestre e que agora está no Hemisfério Sul ainda irá trazer muito calor no próximo ano. Revela ainda que temperaturas recordes foram registradas principalmente no norte da África e sul da Europa. Na Itália, por exemplo, os termômetros chegaram a marcar 48,2ºC; na Tunísia 49ºC, na Argélia 49,2ºC e, no Marrocos, superaram a barreira dos 50ºC.

Em meio a temperaturas extremas e eventos climáticos cada vez mais frequentes, a saúde humana, particularmente nas comunidades mais vulneráveis, está cada vez mais ameaçada, alerta a OMM.

Segundo a representante do Escritório Conjunto OMM-OMS sobre Clima e Saúde, Joy Shumake-Guillemot, os impactos das mudanças climáticas na saúde são amplos, afetando ainda comportamentos sociais, segurança da água, qualidade do ar e segurança alimentar.

Ela destacou ainda que os países de baixa e média rendas estão sendo "impactados fortemente" e acrescenta que as consequências do calor extremo são bastante graves, com até meio milhão de pessoas sofrendo mortalidade excessiva relacionada ao fenômeno climático.

Entre 2000 e 2019, as mortes estimadas devido ao calor foram aproximadamente 489 mil por ano, com uma carga especialmente alta na Ásia, respondendo por 45% dos casos, e na Europa, com 36% das vítimas.

Sobre os desastres naturais, o número de eventos de médio ou grande porte está previsto para atingir 560 por ano, ou 1,5 por dia, até 2030.  Em países com cobertura limitada de alerta precoce, a mortalidade por desastres é oito vezes maior do que em países com cobertura substancial ou abrangente.

Insegurança alimentar

O estudo também reforça que as mudanças climáticas também estão exacerbando os riscos de insegurança alimentar. Segundo o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas, na África, nos últimos três anos, a situação tem sido grave e relacionada ao calor e à seca.

Ele explica que, com frequência, nesses episódios de ondas de calor, a qualidade do ar também é ruim. Por exemplo, em 2003, ano com 75 mil vítimas na Europa, as concentrações de ozônio na superfície eram muito altas.

Segundo o relatório, a poluição do ar já é responsável por cerca de sete milhões de mortes prematuras a cada ano.

Para a diretora do Departamento de Meio Ambiente, Mudanças Climáticas e Saúde da OMS, Maria Neira, a solução seria interromper a causa do problema, ou seja, a queima de combustíveis fósseis. Assim, as emissões e a poluição seriam reduzidas.

ONU News Realidade das ondas de calor extremo, agravadas por incêndios florestais e pela poeira do deserto, têm um impacto mensurável na qualidade do ar

Ela acrescentou que "estamos criando condições para mais doenças não transmissíveis, como câncer de pulmão e infecções respiratórias crônicas, devido à má qualidade do ar que respiramos."

Segundo Maria Neira, existem não apenas “consequências imediatas devido ao desastre climático, mas também deslocamento em massa”.

A transmissão de muitas doenças sensíveis ao clima, como doenças vetoriais, transmitidas por alimentos e água, também está aumentando.

A dengue é a doença vetorial de disseminação mais rápida do mundo, enquanto a temporada de transmissão da malária aumentou em partes do mundo.

Com os eventos climáticos extremos e aquecimento global, ficará mais difícil acessar serviços de água, aumentando também a incidência de doenças transmitidas pela água, alerta a representante da OMS lembrando do recente aumento nos surtos de cólera.

Petteri Taalas, secretário-geral da OMM, admite que não podemos voltar ao clima do século 20, mas devemos agir agora para limitar os riscos de um clima cada vez mais inóspito neste e nos próximos séculos.