
OPINIÃO JM: A vida dos sem passarela

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Protesto BR-470 (Fotos: JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
Reivindicação dos moradores é justa e DNIT deveria abrir o diálogo
A comunidade se mobilizou e as pessoas foram para a margem da BR-470 na manhã do último sábado, dia 7. O protesto foi uma forma de tentar sensibilizar o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) para a instalação de uma passarela na Rua Albertina Maba. A via inicia como uma transversal da Rua Pedro Simon e termina do outro lado da rodovia. O DNIT se mantém irredutível e sem dar maiores explicações.
Enquanto isso, os riscos para pedestres e ciclistas são enormes e se complementam nos relatos dos moradores que sentem a falta de segurança no dia a dia e na dor das famílias abaladas pela perda de seus entes queridos. Somente nos últimos cinco anos foram seis mortes por atropelamento no trecho. Em um dos mais graves, em novembro de 2021, três pessoas morreram – duas no local e uma terceira no hospital. A última tragédia ocorreu há cerca de uma semana, quando uma senhora de 75 anos foi atingida por um caminhão quando tentava cruzar a rodovia para, junto com a filha, ir até a Capela São Braz, participar de um grupo de orações.
Diante de um cenário tão trágico, com histórias dramáticas de perdas que se repetem há vários anos, o protesto deste sábado é justo. O Jornal Metas esteve lá com sua equipe de reportagem, para acompanhar e apoiar o movimento popular que transcorreu dentro da mais absoluta ordem, como deve ser em um país democrático. As três interrupções do trânsito, no sentido Gaspar-Blumenau, duraram cerca dez minutos cada, provocando filas, mas não tiraram a paciência dos motoristas, pois muitos que ali aguardavam sabiam que movimentos como esse podem tirar as autoridades das suas cadeiras e salas refrigeradas.
A Polícia Militar também respeitou o movimento e acompanhou à distância. Já a Polícia Rodoviária Federal, que chegou a informar à Associação de Moradores da Rua Pedro Simon que não permitiria o bloqueio da rodovia, não compareceu.
A expectativa era pelo engajamento de mais pessoas na manifestação, já que o grupo de WhatsApp, criado com a finalidade de organizar o protesto, contava com mais de 400 adesões. Porém, as 100 pessoas que compareceram acreditam, de fato, que é possível vencer a burocracia que reina nas obras públicas no Brasil e ver, enfim, construída a tão reivindicada passarela.
Aliás, não é apenas neste trecho da BR-470 que não existe travessia para pedestres e ciclistas. Em toda a extensão da rodovia duplicada não se vê uma única passarela, o que é um erro grave de engenharia. A duplicação foi projetada excluindo completamente a segurança de pedestres e ciclistas, obrigando-os a verdadeiras maratonas para irem de uma lado da outro. Uma vala, dividindo as pistas, torna a missão ainda mais difícil. Em regiões urbanizadas, como a da Rua Angelina Maba, moradores vivem a roleta-russa diária de tentar cruzar as pistas da BR-470 para irem à escola, trabalho, supermercado, posto de saúde e etc. Como resumiu Nádia Zucki Bagio, filha de dona Belinha Maria Zucki, de 75 anos, a mais recente vítima, “a gente não atravessa a rodovia porque quer, mas porque precisa”.
Dona Belinha era muito conhecida e querida da comunidade. Moradora há 35 anos da região, ela frequentava a igreja e grupos de orações e seu coração era enorme. “Nós estamos aqui tentando que algo seja feito para que outras pessoas não passem pelo o que eu e minha família estamos passando e o que já passaram famílias de outras vítimas”, afirmou Nádia.
Ela pediu consciência aos motoristas. “Aqui neste trecho é 60km/h, mas depois que os carros passam por aqui, aceleram de novo. No trecho onde aconteceu o acidente com a minha mãe, a informação que estou tendo é de que o tacógrafo do caminhão parou em 120km/h”. Emocionada, Nádia revelou que está sendo muito difícil o momento. “Eu tento falar para a minha filha que a vovó, que estava cuidando dela nos últimos dias, não vai mais estar aqui. É muito difícil chegar em casa e não estar com ela. Peço aos motoristas que pensem na preservação das vidas que vivem aqui”, desabafou.
“Infelizmente, tenho, até hoje, a imagem na minha memória, pois eu estava vindo do trabalho e passei aqui momentos depois do acidente com a minha mãe. São mais de 12 anos de luta por segurança neste espaço”, contou Maicon Brizola Ferraz. Cleonice Brizola morreu novembro de 2021, no triplo atropelamento que matou também o casal Waldemir Melo e Vera de Souza Melo.
Após essas mortes, a comunidade protestou e a solução apresentada pelo DNIT foi a de colocar controladores eletrônicos de velocidade. A medida obriga os motoristas a reduzir a velocidade alguns metros antes da Ponte Vale, porém, é somente ali e nada mais, e mesmo assim não existe a garantia de uma travessia segura. No restante da BR-470, a velocidade permitida é de até 100km/h e muitos motoristas pisam fundo e ultrapassam esse limite.
É por isso que a comunidade do Margem Esquerda quer a passarela. Não é possível mais correr tantos ricos, tampouco se perder tantas vidas. A cada morte, vozes se levantam e clamam por mais segurança.
Para os moradores da Albertina Maba, atravessar a BR-470 sem o risco de cruzar as quatro pistas significa percorer cerca de 1km até a Ponte do Vale, o que convenhamos é uma longa caminhada. À noite, sem iluminação na ponte, o risco também torna-se grande. Há dois anos, um ciclista morreu neste local à noite.
Embora a duplicação da BR-470 seja uma obra do Governo Federal, a comunidade precisa do apoio dos representantes do Vale do Itajaí na Assembleia Legislativa e Câmara dos Deputados, assim como de vereadores e do próprio governo municipal para juntos, pressionar o DNIT a executar a obra.
O presidente da Câmara Municipal de Gaspar, Alex Burnier, que participou do protesto ao lado de outros quatro vereadores: Roni Muller, Ciro André Quintino, Carlos Bornhausen e Thimoti Deschamps, é claro: “Dizer para a comunidade que vamos resolver o problema nós estaríamos mentindo porque o vereador não tem esse poder”. E ele tem razão, mas pode pressionar as autoridades responsáveis a executar a obra.
Nesta hora não devem existir lados nem partidos políticos. Alex revelou ter acionado o Departamento Jurídico do Legislativo Municipal para que, via Ministério Público Federal, faça chegar ao DNIT o apelo da comunidade do Bairro Margem Esquerda. “Vamos ver se eles tomam alguma atitude". reforço Burnier. O presidente garantiu que vai continuar encaminhando moções de repúdio ao DNIT, ou indo até eles cobrar providências. “É o que nos cabe fazer”, concluiu.
O presidente da Associação de Moradores da Rua Pedro Simon, Douglas Threiss, o Neni, ainda espera providências do DNIT, mas admite que tem muita mais expectativa do que esperança. “A gente vem conversando com o DNIT há alguns anos, inclusive na véspera do acidente com dona Belinha, um vereador aqui de Gaspar (Alex Burnier) esteve conversando com o engenheiro do DNIT sobre a pavimentação da marginal de acesso à Rua Albertina Maba e a passarela; a resposta foi a mesma, ou seja, não tem previsão para nenhuma dessas obra”.
Segundo Neni, o DNIT informou que a passarela somente poderá ser instalada depois de concluída a obra de duplicação da rodovia e que a prioridade será a passarela da Albertina Maba. Em nota à redação do Jornal Metas na sexta-feira (6), o DNIT confirmou que a construção de uma passarela não está prevista no projeto de duplicação da BR-470, contudo, está estudando a inclusão dessa estrutura em um novo contrato futuro. E assim, fica a pergunta: "Ate quando esperar?"
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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Protesto BR-470 (JULI DESCHAMPS/KASSIANI BORGES)
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