Matéria veiculada neste domingo (7) levanta a polêmica sobre medicamentos que custam verdadeira fortunas

O pequeno Raul Rassele, de 4 anos e 7 meses, morador de Itajaí (SC), filho de Deborah Nobre Rassale, enfermeira da Secretaria Municipal de Gaspar, conseguiu mais um incentivo na luta para obter um dos remédios mais caros do mundo: o Elevidys. Neste domingo, dia 7, o Programa Fantástico, da Rede Globo, exibiu uma reportagem sobre as doenças que precisam de medicamentos que custam verdadeiras fortunas.
Uma única dose do Elevidys, que pode salvar a vida do pequeno Raul, custa R$ 17 milhões. O menino é portador de uma doença rara chamada de Distrofia Muscular de Duchene (DMD), que é a ausência de uma proteína que causa a degeneração progressiva dos músculos. Os comandos saem do cérebro e chegam até os músculos, porém estes estão tão fracos que não obedecem a ordem de se movimentar. A terapia gênica com Elevidys consiste em inserir em uma célula muscular um gene desenvolvido em laboratório que se espalha e regenera as demais células afetadas.

Em 2020, Antonella recebeu o Zolgensma que custou cerca de R$ 12 milhões
  • Em 2020, Antonella recebeu o Zolgensma que custou cerca de R$ 12 milhões (Fotos: ARQUIVO PESSOAL)


Além do Elevidys, outro remédio citado na reportagem do Fantástico é o Zolgensma, usado no tratamento da AME – Atrofia Muscular Espinhal, doença muito parecida com a DMD que inibe a presença de uma proteína relacionada aos neurônios responsáveis pelos movimentos do corpo. Há mais de quatro anos, uma campanha, que começou no Vale do Itajaí e se estendeu por todo o Brasil com o apoio, inclusive, de artistas, conseguiu arrecadar mais de R$ 11 milhões para que a menina Antonella Garcia Cunha Moro, moradora de Blumenau, recebesse o Zolgensma, que é injetado diretamente na medula espinhal. Em fevereiro de 2020, Antonella e a mãe Evelize foram para os Estados Unidos, onde a menina recebeu o medicamento. Antonella evoluiu muito bem depois do tratamento e continua com acompanhamento médico e várias terapias diárias (a mãe tem tornado público, via rede social, a evolução no tratamento da filha).

SUS
No final do ano passado, o SUS anunciou a incorporação do Zolgensma na sua lista de medicamentos, o que seria uma grande vitória para as famílias cujos filhos dependem deste tratamento. O Zolgensma custaria ao governo R$ 6,5 milhões, ou seja, a metade do preço, porém, de lá pra cá, segundo a reportagem do Fantástico, várias reuniões foram realizadas com representantes do laboratório norte-americano sem que se chegasse a um acordo.
Deborah e o marido Rafael esperam que o uso do Elevidys possa ser autorizado em breve pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No final de abril deste ano, Deborah participou de Audiência Pública na Câmara dos Deputados, em Brasília-DF, quando defendeu a necessidade da liberação da terapia do Elevidys no Brasil. “Essa medicação é a nossa esperança. Os resultados mostram que essa terapia gênica, como é chamada essa medicação inovadora, consegue parar o avanço da doença, oferece qualidade de vida aos nossos filhos e aumenta a expectativa de vida. Por isso, precisamos que seja aprovado aqui no Brasil, também”, discursou.
Enquanto aguardam pela decisão da Anvisa, Deborah e Rafael recorreram à justiça para obrigar a União a pagar o tratamento. Um menino de Minas Gerais já obteve autorização judicial e recebeu o Elevidys em maio deste ano, com melhora significativa. Isso animou e deu esperança à família Rassele. Paralelamente, o casal criou uma campanha nas redes sociais para arrecadar os R$ 17 milhões – R$ 15 milhões da aplicação do Elevidys e R$ 2 milhões de despesas médicas e hospitalares (assista vídeo, ABAIXO, e saiba como ajudar).

Sobre a reportagem do Fantástico, Deborah disse que tudo que aparecer na mídia sobre o assunto é importante, mas é preciso falar mais sobre os benefícios que o Elevidys trouxe aos meninos que já receberam o medicamento, como o Enrico, de Minas Gerais, e alguns meninos norte-americanos. "Ao contrário disso, lamenta a mãe, "os médicos exaltam apenas os efeitos colaterais graves, que nos estudos ocorreram em baixa porcentagem". Importante também, segundo Déborah, é ouvir os neuropediatras especialistas que estão acompanhando ativamente os estudos sobre o Elevidys, como por exemplo, o Dr. Felipe Franco (Campinas/SP), responsável pela infusão do Elevidys no pequeno Enrico. "Com relação aos custos do medicamento, ela entende que a ciência e tecnologia necessárias para desenvolver uma Terapia Genica torna o valor exorbitante, porém, quando se trata de uma doença rara, sem cura, neurodegenerativa, como é a Duchene, a qual faz com que os meninos deixem de caminhar pelos 10 anos de idade, e podem morrer entre 20-25 anos, independente do valor, é direito de todos os meninos com Duchene terem acesso ao tratamento, direito garantido na própria Constituição Brasileira", afirma. A isenção de impostos, observa Deborah, pode impactar significativamente no custo final do Elevidys.

Na reportagem, os laboratórios afirmam que existem várias etapas num processo de desenvolvimento complexo deste tipo de medicamento, onde é preciso obter a formulação de acordo até com o peso do paciente, além do fato de serem medicamentos desenvolvidos para doenças raras. “A conta no final precisa fechar”, argumentou o representante de um dos laboratórios. A saída, então, é os órgãos reguladores, como a Anvisa, autorizarem estudos mais prolongados para também desenvolverem estes e outros medicamentos de alta complexidade, bem como endurecer na negociação com os laboratórios que têm as patentes destes medicamentos.


A luta de Raul é também contra o tempo, pois, quanto mais rápido o tratamento for feito, menos sequelas ele terá. No mês de junho, os pais de crianças portadores de DMD receberam uma grande notícia. O FDA norte-americano, equivalente a Anvisa no Brasil autorizou aplicação do Elevidys em crianças sem limite de idade. Até então, somente crianças com até 4 anos e 11 meses poderiam se submeter ao tratamento. Isto porque, os cientistas que desenvolveram o medicamento não sabiam quais os efeitos colaterais em crianças acima dos cinco anos. Novos estudos, mostraram que é possível aplicar o Elevidys em uma faixa etária maior, embora os riscos de efeitos colaterais ainda sejam grandes. Porém, Deborah diz que todos os riscos que possam existir são bem menores do que ver o filho não poder mais caminhar aos dez anos de idade. ”O Raul é uma criança que ama andar de bicicleta, ama ir no parquinho, ama brincar, e eu olhar pra ele e saber que com 10 anos ele pode não mais conseguir andar de bicicleta...jogar futebol”, disse a mãe em entrevista ao Jornal Metas no mês passado. Com 20 anos, Raul corre sério risco de sofrer outras complicações, como doença cardiopulmonar.

O que é a DMD?
A DMD é uma doença genética que se manifesta predominantemente em meninos e leva à degeneração muscular progressiva. Afeta cerca de 700 meninos por ano no Brasil. Sem um tratamento adequado, os músculos enfraquecem, comprometendo a mobilidade e outras funções vitais. Atualmente, a única opção de tratamento no Brasil, que retarda o avanço da doença em apenas dois anos, é a base de corticoide, porém, com vários efeitos colaterais. “O Raul ingere corticoide todos os dias, que tem muitos efeitos colaterais, em função disso ele precisa de acompanhamento com várias especialidades médicas como cardiologia, pneumologia, oftalmologia, neurologia e pediatria”, explica Deborah. Por isso, ela e o marido lutam contra o tempo pra que o filho tenha acesso ao Elevidys.

Sem o Elevidys, Raul perderá a capacidade motora e não mais irá caminhar a partir dos 10 anos, além de enfrentar graves problemas cardíacos e pulmonares. Segundo a mãe, a expectativa de vida para crianças com DMD, quando diagnosticada precocemente, é de 20 a 30 anos. Separar-se do filho precocemente é algo que nem passa pela cabeça de Deborah, pois enquanto existir esperança de cura ela e o marido vão continuar lutando. “Tempo é músculo e músculo é vida”, resume Deborah.

Raul, o irmão Tadeu e os pais Deborah e Rafael
  • Raul, o irmão Tadeu e os pais Deborah e Rafael (Fotos: ARQUIVO PESSOAL)

Assista reportagem do Fantástico (Rede Globo)