A prévia do Censo 2022, que vem sendo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que Santa Catarina é o terceiro Estado brasileiro que teve maior aumento na população desde a última pesquisa, feita em 2010. Comparado ao Censo daquele ano, a população catarinense aumentou 24,2%, passando de 6,24 milhões para 7,76 milhões de habitantes.
Em Gaspar não foi diferente, o crescimento da população foi de praticamente 26% nos últimos 12 anos. No último Censo, em 2010, a população de Gaspar era de 57.981 habitantes, hoje soma 73.053. Apesar de os números exatos ainda não terem sido divulgados, é perceptível o aumento da população residente em Gaspar. Nas última décadas, a cidade passou a receber pessoas vindas de outros Estados, principalmente da região Nordeste, e até de outros países.
O secretário de Assistência Social, Salésio Conceição, revela que essas pessoas vêm para Gaspar atrás de melhores condições de vida, porém, trazem na bagagem dificuldades que somente podem ser resolvidas com a interferência do poder público. Haitianos, cubanos e venezuelanos, apenas para citar três países com forte imigração para o Brasil, esbarram no idioma, além da falta de qualificação profissional. Salésio explica que o município busca atender essa população da melhor maneira possível. Uma das soluções é firmar parcerias com outras instituições, como, por exemplo, a Círculo, a maior empregadora da cidade, e o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) que que desenvolve o projeto ‘Mulheres, Sim’. que já atendeu 25 mulheres estrangeiras, sendo que 17 delas conseguiram se qualificar. A legalização destas pessoas no país é feita por meio Univalli, Instituto Federal e Polícia Federal. “Nós reunimos essa documentação para eles, a questão de construção de currículos, entre outros”, destaca Salésio. Todavia, segundo o secretário, há outra situação peculiar que são as diferenças culturais entre o Brasil e o país de origem dos estrangeiros, e também entre regiões do Brasil. “Alguns não se adaptam à cidade e a Assistência Social operacionaliza o retorno para o seu país ou cidade de origem”, destaca o secretário.
O Sine de Gaspar também recebe todos os dias muitas pessoas vindas de outros Estados, principalmente Norte e Nordeste, em busca de oportunidades de emprego. Além disso, as empresas também procuram o Sine para divulgar vagas de trabalho. “Nós recebemos no Sine empresas procurando por várias qualificações em diversas áreas e também aquelas empresas dispostas a treinar profissionais que não tenham qualificação, mas vontade de aprender e trabalhar. Infelizmente temos dificuldade de encontrar pessoas que se enquadrem nestes perfis. Salésio também diz que muitas vezes as pessoas são encaminhadas para as vagas nas empresas e simplesmente não comparecem na empresa ou desistem da colocação, o que acaba atrasando ainda mais o processo de colocação no mercado de trabalho.


“Gaspar recebe pessoas de outros Estados e países, como os haitianos, cubanos, venezuelanos, que vem buscar uma melhor qualidade de vida”
Salésio Conceição
Secretário de Assistência social



O desafio, com certeza é qualificar a mão de obra. Mas como isso é possível? Um dos caminhos é o Instituto Federal Santa Catarina (IFSC), que oferece cursos nas mais diversas modalidades e de forma gratuita.
A diretora da instituição, Ana Paula Silveira, explica que o IFSC é uma autarquia federal e, desta forma, diferentemente de uma universidade, pode trabalhar na qualificação inicial até a pós-graduação. Além disso, os cursos podem ser sob demanda, fruto de parcerias com empresas, entidades, poder público ou mesmo demandas que o próprio IFSC ou o governo federal identifiquem. “Um exemplo é o curso de costura industrial que está acontecendo atualmente. É um curso de qualificação inicial, que veio como uma demanda do setor do vestuário. Nós fechamos uma parceria com a Cáritas Diocesana de Blumenau para viabilizá-lo. No ano passado, firmamos parceria com a secretaria de Assistência Social e oferecemos também curso de costura para imigrantes, dali eles foram encaminhados para o mercado de trabalho. E como a gente conseguiu fazer esse curso? A secretaria trazia essas mulheres para cá, junto com os filhos e havia recreadores para cuidar das crianças enquanto elas recebiam as aulas”, conta Ana Paula.
Na qualificação continuada, o IFSC tem, por exemplo, um curso de Modelagem Experimental. Neste tipo de curso, o aluno precisa ter algum tipo de conhecimento prévio da área. Os cursos técnicos são cursos de nível médio, com fomento único do IFSC e também pode ser de duas formas: integrados com o ensino médio ou subsequente, quando a pessoa já terminou o ensino médio. “Aqui nós precisamos das parcerias firmadas para estágio e emprego. Hoje nós temos um número de estudantes em estágio elevadíssimo, principalmente na área de desenvolvimento de sistemas. Já na área têxtil, temos a cultura do emprego, mas a absorção tanto em uma área como em outra é muito grande”, revela a diretora.
Nos cursos superiores, as parcerias acontecem da mesma forma: para emprego e estágio para os estudantes. Ana Paula se orgulha em dizer que as empresas já conhecem a qualidade de ensino do IFSC, o que facilita na hora de enviar os estudantes para o mercado de trabalho. “Hoje a Lince tem um número muito grande de funcionários que estudaram do campus Gaspar. Nós temos também uma parceria com a Fundação Hering para desenvolvimento de produto. A Hering tem resíduo da produção e os nossos estudantes criam propostas para utilizar esses resíduos. Nós já temos produto entrado em produção a partir daí. Temos parceria com a Texcotton, já tivemos com a Vøn der Völke, entre outros”, finaliza a diretora do IFSC.

 



Transformando vidas


Hugo Conceição Cortez, de 29 anos, é um exemplo de como a persistência, a educação de qualidade e os programas de incentivo podem transformar a vida das pessoas. Ele é natural de Axixá, no Estado do Tocantins, e até 2018 trabalhava como metalúrgico em Canaã dos Carajás, no Estado do Pará.
Em 2017, a esposa, Djhssica Moreira Cortez, fez o Enem e, por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que oferta vagas em instituições públicas de ensino superior em todo o Brasil, encontrou o curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas (ADS) em Gaspar. “Nós já conhecíamos um casal de Goiás que morava aqui, e decidimos vir. Minha esposa veio primeiro e ficou na casa deles por dois meses. Eu continuei lá concluindo um trabalho, para depois também vir. O objetivo da nossa mudança foi pelo estudo, pela oportunidade de cursos ADS aqui no IFSC”, recorda Hugo.
Djhssica já concluiu o curso e trabalha na Lince Tech, em Gaspar. Hugo está concluindo o seu curso de ADS e atualmente está empregado na SCI Sistemas Contábeis, em Blumenau. “Estamos bem estabilizados em Gaspar, já temos até casa própria. A nossa ideia inicial era nos formarmos e voltar para o Tocantins, mas conhecendo melhor a região decidimos nos estabelecer em definitivo”, conta Hugo.
Para a diretora Ana Paula, a história de Hugo e da esposa Djhssica – e a de outras pessoas que buscaram formação – é a prova de que precisa haver uma mudança na cultura do emprego. “Por aqui nós temos muitas vagas de emprego e, tradicionalmente, as pessoas entendem que quando tem muita vaga, não é necessário estudar para conseguir um emprego. Precisamos mudar essa cultura, para elas entenderem que o estudante do ensino médio não pode deixar de estudar. Se ele quiser trabalhar e tiver menos de 18 anos, ele tem que fazer uma atividade de aprendizagem, porque é dosada para que ele não abandone os estudos. Se ele não terminar o ensino médio não vai chegar ao superior e se ele não chegar ao superior não vai se qualificar do jeito que precisa para um arranjo, por exemplo, como o de desenvolvimento de sistemas, que precisa de aprofundamento técnico”, sustenta.
A diretora lembra ainda que o IFSC é um importante ator na democratização do acesso à educação. “Todos podem estudar no IFSC, nós temos as portas abertas para as pessoas dentro de um princípio de equidade, não de igualdade, porque as pessoas não são iguais, partem de lugares diferentes. Nós trabalhamos com sistemas de cotas, para que todos possam ter acesso ao ensino”, explica Ana paula. Segundo ela, o papel da instituição de ensino que dirige é também de articulação, a fim de firmar parcerias. “Nós precisamos de pessoas, para ofertar ensino de qualidade”, finaliza.

A diretora Ana Paula e o jovem Hugo