Há mais de 40 anos na estrada, o gasparense Gotti fala sobre a vida de caminhoneiro
Aventuras, desafios, alegrias e tristezas. Só quem vive na estrada é que sabe das dificuldades enfrentadas pelos caminhoneiros no Brasil. A saudade da família, a solidão e a insegurança rodeiam a vida de quem escolheu a "boleia" de um caminhão como profissão. Mesmo com tantos obstáculos, mais da metade das cargas no Brasil (59%) ainda circulam pelas rodovias.
Para fazer o serviço, milhares de caminhoneiros se aventuram pelas rodovias e estradas do Brasil, como o gasparense Godofredo de Souza, de 68 anos. O motorista, mais conhecido como "Gotti", tem uma vasta experiência para falar sobre o assunto - afinal são mais de 40 anos de viagens. "Esta difícil ser caminhoneiro hoje? Está! Mas não posso reclamar, pois foi por causa desta profissão que consegui criar meus três filhos", orgulha-se. Gotti nunca sonhou em se tornar um caminhoneiro mas virou motorista devido às oportunidades que foram surgindo em sua vida. Ele nasceu na localidade de Morro Grande, no Margem Esquerda, e ainda criança, aos 12 anos, começou a ajudar a família na plantação de arroz. Aos 16 anos se mudou para o bairro Poço Grande e continuou na agricultura, dedicando-se à plantação da cana-de-açúcar. Aos 20 anos, porém, Gotti trocou a lida na terra pelo trabalho na empresa Círculo. Um ano depois, já empregado na Hering, em Blumenau, comprou uma Kombi. Ele começou então a fazer o transporte dos trabalhadores gasparenses até Blumenau e depois começou a levar os operários da cidade até a obra da antiga Ceval, para a construção da empresa. Quando a obra foi inaugurada, em 1971, o motorista vendeu a Kombi e comprou seu primeiro caminhão: um Mercedes 1167. "Foi assim que iniciei na profissão, puxando soja para a Ceval", recorda-se.
Gotti, em parceria com os amigos Júlio Zimmermann e João Pedro Scheidt chegou a abrir, em 1986, uma transportadora na cidade. A parceria durou alguns anos e mesmo após o fim da Transportadora Ju ele seguiu na profissão. O caminhoneiro já viajou por diversas regiões do Brasil e também para o Paraguai, Uruguai e Argentina. "Naquela época, tínhamos mais segurança e nos sobrava mais dinheiro no fim do mês. Hoje não está nada fácil mas precisamos continuar". A insegurança é, inclusive, o que mais atormenta o caminhoneiro. Também não é para menos: em 1996 Gotti perdeu o irmão, Jaime de Souza, que também era motorista, assassinado durante um assalto no Mato Grosso do Sul. Em 2004, Gotti é quem foi vítima dos criminosos: ele foi rendido e teve uma arma apontada para sua cabeça ao chegar para descarregar em uma empresa em Guarulhos (SP). Porém, nem mesmo a morte do tio fez com que dois dos três filhos de Jaime abandonasse a profissão. Hoje, Marcos José e Wanderlei seguem os passos do pai. O outro filho, Edson de Souza, não viaja mas também é ligado ao transporte de cargas: ele abriu em 2005 a Transgotti ME.
Dificuldades motivaram protestos no início do ano
Quem também ganha a vida viajando pelas estradas deste Brasil é o caminhoneiro Luiz Carlos Koehler, de 56 anos. Tito, como é chamado, reside em Ilhota e ingressou na profissão em 1977 - logo após fazer a sua primeira Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Ele começou dirigindo o caminhão do pai e, naquela época, transportava madeira na região. O tempo passou e Tito foi trabalhar em outras transportadoras até que, em 1990, com a ajuda do pai, comprou seu primeiro caminhão. Desde então trabalha como autônomo e se aventura pelas mais diversas regiões do país. Tito diz que gosta da profissão, mas reconhece que hoje as dificuldades são grandes. "Antes era mais fácil para conseguir os fretes, hoje está difícil aparecer algo que compense colocar o caminhão na estrada". Além da insegurança, o caminhoneiro explica que o preço do óleo diesel subiu demais. Um dos filhos de Tito, Ricardo, seguiu os passos do pai, para desespero da mãe, Maria de Lurdes. "Quando ele disse que iria ser motorista eu fiquei louca. Não queria mais uma pessoa da família na estrada". Hoje, Maria diz que já se acostumou, porém continua apreensiva a cada viagem do marido e do filho. "Sempre peço para eles darem notícias", diz.
O baixo valor pago aos fretes e o preço do óleo diesel, citado por Tito, foram alguns dos fatores que motivaram um protesto dos caminhoneiros em todo Brasil, realizado em fevereiro deste ano. A ação durou cerca de 15 dias e, literalmente, "parou" o Brasil. Em Santa Catarina, as manifestações mais intensas ocorreram no Oeste, apesar de caminhoneiros também terem se manifestado no litoral norte, em Itajaí. Os protestos - que bloquearam rodovias por todo país - afetaram o abastecimento em algumas regiões e inviabilizaram a produção de setores como laticínios e carros - mostrando a importância e quanto é fundamental o transporte de carga pelas rodovias no País. Os caminhoneiros só liberaram as estradas após a presidente Dilma Rousseff sancionar a Lei dos Caminhoneiros que garante a isenção de pagamento de pedágio para cada eixo suspenso de caminhões vazios, ampliação de pontos de parada para descanso e repouso, não reajustar o preço do diesel nos próximos seis meses, entre outros benefícios. A presidente também autorizou o BNDES a dar carência de um ano para o pagamento dos empréstimos feitos para comprar caminhões.
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