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Empresários podem passar a pagar mais imposto em 2026 (Fotos: FREEPIK)
O especialista em direito tributário, Alcides Lima Neto, explica quais as principais alterações tributárias a partir de 1º de janeiro
A Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 15, o texto-base de regulamentação de pontos da reforma tributária. A matéria detalha como o governo vai cobrar e decidir sobre controvérsias do futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), tributo que unificará os atuais ICMS (estadual) e ISS (municipal). A reforma tributária entra em vigor em 1º de janeiro de 2026, numa fase que o governo vem chamando de transição.
O texto também estabelece procedimentos para criação e funcionamento do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (CGIBS). O Comitê será responsável por gerir o IBS, reunir representantes de todos os entes federados para coordenar a arrecadação, a fiscalização, a cobrança e a distribuição do imposto; elaborar a metodologia e o cálculo da alíquota, entre outras atribuições.
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Brasileiro pode pagar mais imposto a partir de 2026 (Fotos: FREEPIK)
Esse é o segundo texto que tramita no Congresso com o objetivo de regulamentar pontos da reforma tributária, aprovada no fim de 2023. O primeiro, já sancionado pelo presidente Lula, tratava das regras de incidência do Imposto Sobre Valor Agregado (IVA Dual), que se subdivide em dois tributos básicos sobre o consumo: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), arrecadado em nível federal, e o IBS.
Advogado há 23 anos, especialista em planejamento tributário, estruturação societária e proteção patrimonial, Alcides Lima Neto, da Lima Neto Advogados, diz que o primeiro passo é entender o que está por detrás da reforma tributária, que é diferente do que vai ocorrer na prática.
“O discurso do governo é que a reforma foi criada para desburocratizar o sistema tributário brasileiro, unificando vários impostos e principalmente por fim a bitributação (cobrança de imposto sobre imposto), o que onerava muito os produtos e serviços no Brasil”, explica Lima Neto. Para o especialista, o governo nunca prometeu diminuir a carga tributária, hoje uma das mais altas do mundo. “O objetivo principal é gerar um novo formato de sistema que torne possível a desoneração de produtos sobre produtos e serviços, mas somente para aquele que estiver pronto e estruturado para gozar dos benefícios das novas regras”.
Setores mais impactados
Lima Neto explica que a reforma tributária vai beneficiar um setor em detrimento de outros. “A indústria urbana, formada por grandes fabricantes de eletrodomésticos e magazines, que tem forte influência junto ao governo, estava com carga tributária pesada; este será o grande beneficiado do novo sistema tributário brasileiro”, revela.
Em contrapartida, segundo o advogado, a conta vai cair no colo, principalmente, de donos de patrimônio, pequenos negócios e prestadores de serviço (médicos, advogados, dentistas, arquitetos, engenheiros entre outros). Já na área patrimonial, o prejuízo maior será o do agronegócio.
Os dois novos impostos, IBS e CBS, destaca Lima Neto, vão atingir desde o vendedor de água na sinaleira ao maior empresário do Brasil.
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Lima Neto, sócio da Lima Neto Advogados, e especialista em tributação (Fotos: DIVULGAÇÃO)
"Todo mundo vai pagar PIS, COFINS, ICMS, IPI (Imposto Sobre Produto Industrializado), porém, unificados em dois impostos: IBS e CBS. Juntos, esses dois impostos vão engolir 28% do valor de qualquer transação financeira no Brasil."" – Lima Neto, advogado especialista em Direito Tributário
Uma das principais mudanças é a forma como esses impostos vão chegar aos cofres dos governos federal, estadual e municipal. “O empresário não vai mais pagar os impostos em guias, emitidas até 30 dias após a venda ou a prestação do serviço. O desconto vai acontecer no ato da transação financeira sob qualquer forma de pagamento: Pix, cartão de crédito, boleto ou DOC. O imposto será separado no ato da transação e vai somente o dinheiro líquido para a conta do recebedor”, explica Lima Neto. A única transação financeira que pode escapar da tributação imediata é o pagamento em dinheiro, pois o governo não terá como controlar.
No modelo atual, lembra o especialista, o empresário costumava atrasar o pagamento de impostos para saldar compromissos mais urgentes, como salários e aluguel. A partir da reforma tributária, não será mais possível. “A medida quer acabar com a inadimplência e a própria sonegação no Brasil”.
"De acordo com a Procuradoria da Fazenda Nacional/Receita Federal, a inadimplência fiscal no Brasil soma R$ 7 trilhões. Esse é o valor reconhecido, porém, o governo calcula que a sonegação é duas vezes maior, ou seja, em torno de R$ 30 trilhões deixaram de entrar nos cofres públicos." –
O modelo que está sendo adotado, esclarece Lima Neto, é uma cópia do norte-americano, com uma diferença. “Lá, o imposto é muito menor do que no Brasil”.
O advogado especialista chama atenção para o forte impacto no fluxo de caixa das empresas, pois não será mais possível empurrar o pagamento do imposto para frente ou aguardar por um Programa REFIS, que renegocia dívidas tributárias. “O fluxo de caixa do pequeno e do médio comerciante vai ser impactado", complementa.
Lima Neto vai mais adiante, e alerta que quem não estiver preparado para isso, pode até quebrar. Ele assinala que sobre esses 28% imposto não estão somados o Imposto de Renda, contribuição social sobre lucro, Imposto Predial Territorial Urbanao (IPTU) e Imposto Territorial Rural (ITR).
Outra mudança significativa, explica Lima Neto, é o brasileiro ter de se acostumar com o sistema de crédito tributário. “A carga tributária desses impostos, via de regra, vai ser 28%, mas para alguns segmentos vai ter um redutor que pode chegar a 14% ou até 11%, no caso do setor imobiliário. O mesmo vale para profissionais liberais. Vai ser semelhante a uma conta bancária corrente, só que com débito e crédito de imposto”. O desafio do empresário, observa o advogado, é o empresário pagar o imposto no ato da venda ou do serviço.
É neste ponto, de acordo com Lima Neto, que o empresário, seja ela grande ou pequeno, vai precisar do trabalho de um especialista em tributação, que vai poder auxiliar a empresa a obter os créditos. “Pagando o imposto cheio e não conseguindo compensar no redutor de índice, em 90 dias 100% do fluxo de caixa da empresa pode estar comprometido”, argumenta o tributarista. Ele revela, ainda que o empresário optante pelo simples nacional não vai gerar crédito tributário. “O novo sistema tributário criou o simples nacional híbrido, juntamente com o regime de lucro presumido ou lucro real serão as hipóteses de geração crédito".
Se você pretende vender algum imóvel a partir de 1º de janeiro também vai ter surpresas. Se o comprador tiver uma empresa de compra e venda de imóveis, ele já terá de descontar 11,2% do IBS e CBS, para gerar crédito a ele. A mesma regra vale para os pequenos produtores rurais, que costumam vender seus produtos agrícolas usando o CPF, assim como o pequeno prestador de serviço. Neste caso, a ideia do governo é desestimular a informalidade.
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Se o empresário não for orientado pode perder dinheiro na reforma tributaria (Fotos: Freepik)
Empresário vai precisar conhecer muito mais sobre gestão de negócio
Lima Neto chama atenção que que a reforma tributária, como tudo no Brasil, é complexo, por isso o empresário sempre negligenciou o conhecimento sobre estruturação societária e como isso impacta no lucro do negócio ou no patrimônio dele. “Ele vai precisar passar a conhecer as regras ou contratar especialistas, para um planejamento tributário que não deixe dinheiro na mesa do governo”.
Trocando em miúdos, o empresário necessariamente não poderá mais se limitar a conhecer de venda serviço, mas da gestão do negócio como um todo. “Esse é o maior desafio para o empresário brasileiro, pois ele até pode vender mais, porém, se não tiver conhecimento sobre o sistema tributário vai sobrar menos dinheiro na conta”, alerta Lima Neto.
A conta da isenção do Imposto de Renda
As empresas de grande porte estão se antecipando e resolvendo outro problema, que é o adicional de 10% no Imposto de Renda retido na fonte para quem recebe distribuição de lucro acima de R$ 50.000/mês. “Eles estão montando estruturas jurídicas fora do país, para não ter que pagar essa conta que o governo repassou por causa da nova lei que isentou do IR de quem ganha até R$ 5 mil/mês, mas, a verdade, é que o pequeno empresário não tem condições de investir nessa engenharia tributária, o que também pode gerar um problema sério”, diz o advogado. No entender dele, o governo equalizou essa conta injustamente. "Uma pessoa que ganha acima de 50 mil vai pagar os mesmos 10% de quem ganha, por exemplo, R$ 10 milhões. Ficou desigual demais para a classe média, que novamente vai pagar a conta e empobrecer ainda mais”, observa.
Lima Neto vê o novo sistema tributário como um avanço no Brasil, mas reforça a necessidade do empresário estar bem estruturado e contratar pessoas que saibam orientá-lo. “Infelizmente, para a grande maioria, essa não será a realidade. Falta conhecimento, informação e o governo não tem interesse de levar informação à sociedade porque precisa arrecadar mais, tapar o buraco das contas pública”, finaliza.
Dois pontos importantes
"Criou-se um sistema que consegue aumentar a arrecadação sem precisar de muito trabalho e coloca a população como fiscal, porque o crédito tributário vai desestimular a compra informal (sem nota).
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"O governo consegue ter gestão de tudo que acontece, arrecadar sem ter de contratar mais mão de obra por conta da tecnologia que vai fazer o trabalho humano de tentar acabar com a sonegação." –
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