Há uma silenciosa luta contra o "dobrar-se" que perdura séculos e afeta mulheres de todas as idades. O patriarcado insistentemente cala a expressão feminina em um discurso ancestral tão bem construído que encaramos como natural.

Houve um tempo em que tínhamos livros direcionados às meninas que ensinavam posturas sociais que iam do modo de falar até o ritual de tratamento do marido. Hoje, esse manual de boas maneiras femininas não circula por aí, mas as piadas e comportamentos de alguns machos deixam claro que ainda perduram hábitos do Século XIX entre nós. Há uma insistente tendência em colocar o feminino no lugar de subserviência.

Não é "mimimi" não, o Brasil é o 5º país em morte violentas de mulheres no mundo. Sim, machismo mata. A palavra feminicídio só surgiu nos anos 70 para diferenciar de homicídio as mortes em uma sociedade que naturaliza a violência de gênero tanto em piadas de boteco ou na culpabilidade da mulher vítima de estupro. Em se tratando de mulheres negras, os dados são assustadores: dois terços das mulheres assassinadas no Brasil são negras.

O machismo mora nos detalhes de uma simples conversa de bar quando um homem interrompe uma mulher e tenta explicar o que ela disse aos convivas desmerecendo o conhecimento da mulher.

Meus pensamentos de hoje são sobre música e mulheres. Quantos de nós ouvimos ou cantamos versos machistas nas músicas sem qualquer estranhamento. Isso é só coisa de funk? Engano de quem pensa assim. Veja esse verso: Mulher que nega. Nega o que não é para negar. A gente pega, a gente entrega. Quem assina é Vinicius de Moraes, o poeta lembrado como romântico.

Em muitas músicas, antigas e atuais, o que vemos é muito sexismo e misoginia em vários tons de "amor" - uma verdadeira romantização da violência.

E quando se trata de mulheres musicistas e seu espaço na cena musical? Os homens são a maioria nas posições de poder nas gravadoras, estúdios, escolas de música, a maior parte dos produtores musicais e de eventos, jornalistas e críticos que decidem os nomes em evidência.

Se você duvida do que afirmo aqui, pergunte a uma - apenas a uma - amiga musicista e ela terá uma dúzia de histórias que envolvem acesso à cena dominantemente de homens. É histórico que essa dicotomia macho/fêmea hierarquiza. Felizmente as vozes abafadas começam a tomar seu lugar.

Ainda bem que há mulheres que se levantam da mesa quando suas vozes não são ouvidas, cantam alto e tomam as ruas. Eu levanto com elas e as sigo.

Fica a dica: 

O livro Calibã e a Bruxa: Mulheres, corpo e acumulação primitiva de Silvia Fererici. Editora