Racismo se aprende em casa
08/12/2017 16:37

Dia desses, ao ouvir uma notícia sobre racismo, meus filhos de seis e cinco anos perguntaram do que se tratava. Durante a explicação, notei que eles tiveram dificuldade em entender porque alguém haveria de não gostar de outra pessoa por conta da cor da pele. Para eles não fez sentido. Lembrei na hora de um vídeo que circulou um tempo atrás na internet, de um garoto louro que cortou o cabelo bem curto para ficar "igual" ao melhor amigo, que era negro. A intenção dele era confundir a professora.
Essas atitudes descontaminadas das crianças nos provam que racismo é algo que se aprende e ressaltam a importância dos valores que recebemos e transmitimos. O racismo sempre esteve e continua vivo em muitas famílias brasileiras. Seja em piadas consideradas sem maldade, seja no emprego pejorativo das palavras preto, negão, neguinho, ou no espanto que nos causa ver um branco trabalhando para um negro. O racismo se faz presente também na própria autoestima dos negros - que por séculos foram levados a crer que sua cor não era a melhor, que seu cabelo não era o mais bonito, que seu cargo não poderia ser o mais alto. Embora tenhamos visto um negro ocupar o posto mais poderoso do mundo - a presidência dos Estados Unidos - ainda temos um longo caminho de evolução a percorrer.
E não somente porque não faz sentido discriminar ninguém; mas porque o racismo tem tomado proporções alarmantes. Um relatório publicado em 2016 pelo Senado Federal por meio da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o Assassinato de Jovens, mostrou que existe um genocídio em curso no país contra a população negra. A violência nos tira nada menos que 23 mil jovens negros brasileiros por ano. E as mortes violentas afetam em particular as mulheres negras, que são quase 70% das vítimas femininas de agressão.
Não tenho conhecimento de uma iniciativa eficaz do Estado brasileiro para combater essa realidade - embora acredite que esse papel é de cada cidadão. Precisamos desaprender o racismo. Policiar nossas palavras, repensar nossos conceitos, resgatar a pureza das crianças. Estimular e lutar pela igualdade de condições, nos indignar quando testemunharmos alguma ofensa. Embora tenha algumas restrições sobre a questão das cotas, penso que no estágio em que nos encontramos ainda sejam uma ferramenta necessária.
Infelizmente existem (muitas) pessoas que simplesmente não se conformam em ver um irmão ou irmã negros em posição de destaque. Nem mesmo quando se trata de uma criança, como vimos acontecer recentemente com a filha de um casal de atores. Atitudes assim são resquícios de tempos sombrios de escravidão. Já foi pior. Mas o que vemos hoje é uma escravidão velada. Essa escravidão implícita em comentários maldosos, olhares de desprezo, salários menores e oportunidades escassas é presente e assustadora. E precisa ser combatida. Se a nossa geração não der conta do recado, que ao menos pare de perpetuar comportamentos e conceitos descabidos.
Como escreveu Nelson Mandela, que por ser negro passou quase trinta anos preso num cubículo, "Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar".