Necessidades muito especiais
21/10/2016 17:35

A bola da vez de todas as editorias econômicas dos jornais é a crise da previdência pública. Embora o problema seja antigo, agora parece, enfim, que a questão despertou a atenção nacional. Não é para menos. Este ano, o país vai pagar R$ 230 bilhões para cobrir o rombo entre o que se arrecada e o que é preciso pagar aos beneficiários do Regime Geral e do Regime Próprio de previdência. Os números têm sido exaustivamente analisados, checados, contestados. Mas há outra face do problema da qual quase não se fala: o país está envelhecendo e não estamos preparados para acolher este novo contingente de idosos.
Desde o sistema previdenciário, passando pelo sistema de saúde até a mobilidade urbana, o Brasil não se preparou para envelhecer. Em 40 anos, o número de pessoas com 70 anos ou mais aumentou cinco vezes no país. Saltou de 1,7 milhões para 8,8 milhões e já representa 4,6% da população. Característica de países mais desenvolvidos, a grande quantidade de habitantes idosos nunca foi uma prioridade das políticas públicas brasileiras. Mas esse é o caminho que estamos começando a trilhar. Como criar ambientes amigáveis a uma população com características tão especiais? Como não condenar nossos idosos a ficarem presos em casa por falta de segurança?
Um grupo de 300 idosos está participando de uma pesquisa com três anos de duração que deverá trazer algumas respostas. Até 2019, o projeto Brazil-UK Healthy Urban Living and Ageing in Place (HULAP), conduzido por pesquisadores de saúde pública e de planejamento urbano da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da Queen's University de Belfast, da Irlanda do Norte, vai estudar formas de proporcionar estruturas urbanas compatíveis com as necessidades das pessoas mais velhas.
Ao longo do estudo, serão coletadas informações sobre os hábitos diários dessas pessoas e examinadas políticas existentes sobre saúde, ambiente social e planejamento urbano em diferentes bairros de Curitiba, onde os idosos estão sendo estudados. Os pesquisadores pretendem identificar os obstáculos mais enfrentados ao longo do dia e as oportunidades de novos equipamentos e políticas. Mesmo pessoas que nasceram no meio rural estão migrando para as cidades e lá envelhecem, sem atrativos que os encorajem a seguirem ativos.
Quem tem um idoso na família, ou convive com algum, faz ideia das dificuldades de transitar pelas cidades quando muitas vezes se ouve ou enxerga mal, tem dificuldades de locomoção ou mesmo se é vítima de pessoas mal intencionadas. Mesmo os idosos mais saudáveis e ativos não estão em condições de depender de um transporte público precário ou de esperar meses por consultas e exames. Esse é mais um problema que precisaremos encarar de frente.
O projeto que se inicia em Curitiba é louvável e pode trazer indícios importantes para políticas futuras. A expectativa de vida no Brasil pulou de 53,3 para 72,8 anos. Em Santa Catarina, temos a maior taxa nacional de longevidade: 78,4 anos. Tão importante quanto sanear o sistema das aposentadorias que sustentam nosso enorme contingente de idosos, é preparar o país para estes cidadãos que construíram a nossa história até aqui.