Cumpra-se a Lei 148
Criada para dar fôlego aos Estados sufocados pelos juros exorbitantes da dívida com a União, a Lei 148 nunca cumpriu seu verdadeiro papel de corrigir uma histórica injustiça fiscal. Mesmo tendo nascido no Planalto, aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República, nenhum Estado conseguiu aplicar o novo indexador (IGP-DI para IPCA) e reduzir os juros de 6% para 4%. Estávamos dependendo da regulamentação, publicada no apagar das luzes de 2015 no Decreto 8.616.
E o que deveria ser a solução, tornou-se um problema. Em vez de diminuir, o decreto aumenta a conta. Abro aqui parênteses para detalhar os números. Em 1998, quando houve a renegociação, Santa Catarina devia R$ 4 bilhões. Pagou R$ 13 bilhões até o final de 2015. E deveria, segundo o recálculo feito em 2016 pela União, outros R$ 9,5 bilhões. Haveria acréscimo de mais de R$1 bilhão ao estoque anterior. Não faz nenhum sentido.
Com números em mãos, respaldados pelos estudos dos melhores profissionais do Estado e com o parecer do renomado jurista e ex-ministro Carlos Ayres Britto, tentamos negociar com o Tesouro Nacional. Sem sucesso, não tivemos alternativa: decidimos pedir o cumprimento da Lei 148. Nascia a Tese de Santa Catarina. Foi no artigo 3º da lei que se baseou a ação: "A União concederá descontos sobre os saldos devedores dos contratos referidos no art. 2º".
O jurista Ayres Britto é categórico ao observar que o prometido não é cumprido: "Ora, ao prever como critério de aferição dos descontos do saldo devedor do Estado para com a União um método distinto daquele previsto na lei, o que fez o Decreto 8.616/15? Entrou em rota de colisão frontal com o seu conteúdo material e, mais do que isso, com a sua declarada e essencial finalidade: reduzir o nível de endividamento das unidades federadas. Razão pela qual é de ser denunciada a sua invalidade material".
Em 7 de abril, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, por unanimidade, que a União não pode nos impor sanções até o julgamento do mérito.A liminar é também uma demonstração dos ministros de que nossa tese é plausível. A decisão gerou reação em cadeia, com liminares favoráveis ao Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Mato Grosso, Pará, Alagoas e São Paulo também acionaram o Supremo.
A União reagiu e passou a rebater o movimento dos Estados. Anunciou que esse cálculo causará um rombo de R$ 313 bilhões. Esquece que quem sofre com o rombo são os Estados, que ao longo dos últimos 17 anos pagaram caro pelas suas dívidas. Não considera que os mesmos Estados têm de garantir à população acesso a saúde, educação e segurança. Ainda assim, estamos com nossas contas em dia, não parcelamos salários ou aumentamos impostos, muito menos tivemos de lançar mão de "contabilidade criativa" para fechar nossos balanços.
Outro equívoco está na nota técnica do Ministério da Fazenda, que considera a Tese de Santa Catarina a ruína apocalíptica do Sistema Financeiro Nacional. Cita a poupança, contratos de financiamento, títulos públicos e privados, etc. Nosso Mandado de Segurança questiona pura e simplesmente as relações entre União e Estados e não possui inclinação para desconstruir métodos usados pelas Instituições Financeiras nas negociações privadas. Aliás, nem poderia, porque a Lei 148 apenas trata de critério para "desconto", reconhecendo que já cobrou demais dos Estados desde 1998.
Santa Catarina não questiona o contrato, apenas pede que a legislação que nasceu da própria União seja respeitada. Cumpra-se a Lei 148.