Refis agrícola gera polêmica
A última sessão do ano, foi a mais longa e rendeu embate entre governo e oposição
A última sessão ordinária da Câmara de Vereadores de Gaspar em 2025 foi uma das mais extensas dos últimos anos. Com uma pauta composta por 11 projetos de lei e duas moções de aplausos, a reunião se estendeu até as 21h30 e atraiu grande público, entre homenageados e agricultores.
O principal ponto de tensão foi o Projeto de Lei Complementar 8/2025, que institui o Refis Agrícola, Programa de Recuperação de Créditos da Secretaria Municipal de Agricultura e Aquicultura, destinado à regularização de débitos gerados pela utilização dos serviços de mecanização agrícola do município.
Logo no início da sessão, o vereador Dionísio Bertoldi (PT) apresentou requerimento oral para retirar o critério de urgência do projeto, propondo que a votação fosse adiada para a terceira sessão de fevereiro de 2026.
Ele justificou o pedido afirmando que o tema precisava de mais tempo para debate e que agricultores teriam efetuado pagamentos a ex-secretários municipais, o que, segundo ele, demonstrava descontentamento com a proposta, já que a dívida permanece ativa, sem baixa registrada. A solicitação, porém, foi rejeitada por 11 votos.
A manifestação provocou forte reação no plenário. O líder do MDB, vereador Ciro Quintino, solicitou a suspensão da sessão por cinco minutos para reorganização dos trabalhos.
Na retomada, a líder do governo, vereadora Alyne Serafim (PL), defendeu o projeto, afirmando que o Refis Agrícola é uma oportunidade para agricultores regularizarem seus débitos com o município. “Um erro não justifica outro”, destacou, pedindo ainda que o líder do PT citasse nominalmente os ex-secretários que teriam recebido pagamentos irregulares.
Relatora da proposta, a vereadora Sandra Hostins (PL) rebateu as críticas dos vereadores Giovano Borges (PSD) e Dionísio Bertoldi (PT). Ela afirmou que o projeto tramita na Casa desde outubro e que promoveu diversas reuniões com agricultores, conselhos e parlamentares. Sandra também destacou que a adesão ao programa é facultativa e fez a leitura integral do posicionamento do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural (CMDR), que recomendou a aprovação do projeto
Durante a discussão do projeto, o vereador Roni Muller (MDB) apresentou um requerimento oral solicitando a supressão integral do inciso V da proposta. O pedido, no entanto, foi rejeitado por 9 votos a 3, após nova suspensão temporária da sessão para análise das bancadas.
O inciso em questão trata da formalização da adesão ao programa, que prevê uma série de exigências para os interessados. Entre elas estão: reconhecimento expresso da integralidade do débito; renúncia a qualquer defesa ou recurso administrativo; desistência de eventual ação judicial ou recurso interposto, com comprovação nos autos do processo administrativo e compromisso de manter em dia os débitos futuros relacionados à utilização dos serviços rurais.
O projeto do Refis, acabou sendo aprovado com apenas três votos contrários, dos vereadores Giovano Borges, Dionísio Bertoldi e Roni Muller. A reunião prosseguiu com os demais itens da pauta, foram aprovados. A próxima sessão está agendada para quinta-feira, dia 11 de dezembro, às 18h30, no plenário da Câmara de Vereadores de Gaspar. Será específica para escolher os novos representantes da Mesa Diretora. Na terça-feira, dia 16, às 18h30, ocorre a Sessão Extraordinária para debater 10 projetos de leis.
O que diz o comunicado do CMDR
O Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural (CMDR) analisou a denúncia envolvendo os serviços da Patrulha Mecanizada após reuniões realizadas em julho e setembro deste ano. Segundo o órgão, todos os conselheiros estão regularmente nomeados e participaram das deliberações, que incluíram consultas jurídicas e diálogo com diversas entidades.
O CMDR informou ter recebido da Câmara de Vereadores o Projeto de Lei Complementar nº 08/2025, que cria o Refis Agrícola, e encaminhou parecer favorável por meio do Ofício nº 02/2025. O projeto, que teve pedido de vistas já analisado, está previsto para votação no dia 9 de dezembro.
A presidente do Conselho destacou que a adesão ao Refis será opcional e que cada produtor poderá buscar seus direitos pela via jurídica, caso entenda necessário. O CMDR afirma ter empenhado esforços para uma solução equilibrada e pediu aos vereadores que aprovem o projeto.
Entenda a história
Em agosto de 2025, o Jornal Metas revelou que a Prefeitura de Gaspar havia iniciado a cobrança de dívidas referentes aos serviços da Patrulha Mecanizada prestados entre 2019 e 2024. A situação ganhou repercussão após agricultores receberem notificações inesperadas sobre pagamentos em aberto por serviços realizados em suas propriedades com máquinas e equipamentos públicos.
Segundo a administração, os débitos foram identificados após uma intimação do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), que solicitou esclarecimentos sobre o controle e a cobrança dos atendimentos executados durante o período. Uma revisão interna da Secretaria de Agricultura e Aquicultura apontou que mais de R$ 800 mil deixaram de entrar nos cofres públicos em cinco anos. O valor devido atual é de R$ 537.711,49, já que alguns produtores regularizaram suas pendências.
Outros, porém, contestam as cobranças. Entre as principais queixas estão os juros e multas aplicados, além da ausência do desconto de 0,5% previsto em lei para quem emite nota fiscal. Também relatam divergências em comprovantes de atendimento, muitos deles sem assinatura dos produtores, fato que compromete a validade jurídica dos débitos.
O caso gerou reação no Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural (CMDR), que divulgou uma carta afirmando que a Secretaria deixou de apresentar as prestações de contas anuais obrigatórias nos dois últimos anos do governo anterior. O Conselho ressaltou que nenhum agricultor se negou a pagar pelos serviços e que, até o fim de 2024, todos eram informados oficialmente de que não possuíam débitos. Destacou ainda que produtores inadimplentes continuaram recebendo atendimentos, o que contraria a legislação e indicaria falhas no controle interno.
Outro ponto levantado pelos agricultores é que alguns atendimentos teriam sido quitados por meio de acordos informais, com compensações em produtos ou serviços prestados à Prefeitura. Eles pedem que essas tratativas também sejam reconhecidas.
A origem do caso remonta a janeiro de 2024, quando o ex-prefeito Adilson Schmitt, na condição de cidadão, solicitou informações sobre a Patrulha Mecanizada por meio da ouvidoria municipal. Sem resposta, ele acionou o Ministério Público em abril do mesmo ano.
A Promotoria intimou o então prefeito Kleber Wan-Dall a apresentar documentos e esclarecer a falta de transparência. Diante de respostas consideradas insuficientes, o MP instaurou um inquérito civil e renovou as cobranças ao Executivo.
Após nova intimação, em junho de 2025, a nova administração iniciou um levantamento detalhado e identificou os débitos, dando início às cobranças. O CMDR solicitou uma audiência com a Procuradoria do Município para buscar alternativas, entre elas, a criação de um programa de renegociação, como um Refis rural, que agora está sendo discutido.